terça-feira, 17 de maio de 2011

Indignação

Indigne-se, é só o que eu peço. Sei que a indignação sem a proposição de idéias e sem um conjunto de ações tem pouca chance de mudar a realidade (sobretudo no que tange às mazelas sociais historicamente constituídas). Mas, de qualquer forma, indignar-se é mover-se. É sair de si e, sobretudo, colocar-se no lugar do outro, seja esse outro um indivíduo ou um sujeito coletivo, um amigo ou um absoluto estranho. Quem se indigna, questiona a realidade. Ainda se incomoda e faz algo mais do que estar no mundo. A indignação é pulsante, nos deixa desconfortáveis e é no desconforto que buscamos outra posição.
Eu posso me comover com filmes românticos ou com catástrofes naturais (que muitas vezes nem tão naturais são). Mas devo me indignar quando vidas e dignidades são negadas (indignem-se com isso e não se comovam com as coberturas da imprensa sensacionalista).
Existe um discurso de culpabilização do governo pelos problemas sociais, mas a questão é que confundimos representatividade com delegação de poderes. Aí vira lamentação: o governo não isso… não aquilo… e nos esquecemos da nossa parcela. A sociedade civil tem a sua parcela de culpa em tudo, tudo mesmo! Quem votou? Quem não se indignou diante da corrupção? Questiono principalmente a emergente e complexada classe média, que fica infeliz com a dificuldade de encontrar quem queira ser doméstica (o) (ou escrava(o)?).
Nesse momento, minha indignação, que tantas vezes fora voltada para o governo e para os governantes, se vira para a sociedade civil.
Há algum tempo, a praça próxima à minha casa tem sido ocupada por moradores de rua. Os moradores do bairro, de classe média, se “indignaram”: mendigo suja a paisagem, desvaloriza o imóvel. Procuraram o poder público? Sim. Para que ele limpasse a praça. Não me lembro de promoverem uma discussão sobre a responsabilidade social do governo em relação àqueles sujeitos. O governo não limpou a praça (note: a praça é o importante). Aí alguém teve a “brilhante” idéia de envenenar, na calada da noite, os moradores da praça. Quem? Um pai de família, um comerciante de bem, um vizinho qualquer. Não minimizo os prejuízos e os incômodos dos moradores (lembre-se que moro no bairro). O que foi minimizado foram os valores desse sujeito: genocida, eugenista, bandido. Que valor damos à vida?
Quero, ainda, me indignar com a imprensa (me perdoem as exceções). Gentalha! Como não morreu ninguém (até o presente momento) a cobertura local é rápida e indolor (sem comoções). Na rede Globo, a notícia ficou espremida entre assaltos ao comércio local (matéria requentada) e a cobertura do clássico. Afinal, o que são mendigos (note-se: não seres humanos) diante do espetáculo do povo. Alguém se lembrará de algo depois?
Ninguém morreu! Então, não é chacina. Então, não é notícia. Então… só morreu a dignidade. Só! Banalizamos o mal, calamos os inocentes e não nos indignamos. Bem-vindos à barbárie!



Érica Melanie

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